Carlos Matos: na vanguarda sonora

Indiscutivelmente uma das pessoas mais arrojadas e diligentes da cena musical alternativa em Portugal, Carlos Matos produz e organiza concertos desde o início deste século. Sou uma espécie de garimpeiro sonoro, sempre à procura das músicas perfeitas, extravagantes ou disruptivas para passar nos meus dj sets. É consultor de editoras, faz pós-produção de áudio, locução, gestão de conteúdos, programação cultural e tem em mãos a Fade In - Associação de Acção Cultural.

Nas curvas e contracurvas da sua juventude, não fosse a música e teria optado pelo futebol. Escolha sem amargura, pois era “apenas” um apaixonado. O problema é quando, para além do simples gosto de a quereres ouvir e dissecar, passas a ter necessidade de a fazer ou de a ver executada ao vivo.

Entre as chamadas à seleção nacional e uma passagem pelo Sporting Clube de Portugal, Carlos ganhava para ir compondo a sua coleção de discos. Naturalmente irreverente, a desconexão com o ambiente futebolístico era cada vez maior, portanto, aproveitar uma lombalgia para pendurar definitivamente as botas foi o melhor que fiz. A transição aconteceu e a entrega à música foi exclusiva. No mesmo ano em que desiste deste desporto, em 1994, abriu a Alquimia, uma loja de discos onde esteve até 2007.

Na viragem para o novo milénio nasceu a Fade In. Não foi mais do que o acumular de muita vontade e também de dezenas de concertos em Leiria e arredores que o Carlos e Célia Lopes (fundadora da Fade In e proprietária da Alquimia) produziram entre 1994 e 2000. Surgiu da necessidade de dar enquadramento legal à nossa produção de espetáculos, refere. O trabalho da Fade In e o que foi feito previamente, não começa agora a moldar hábitos culturais em Leiria, pois já o faz, e permite-me a “arrogância”, há mais de duas décadas!.

Partilhar bandas e os artistas com o maior número de pessoas é a bandeira. Ao longo deste percurso, a equipa tem conseguido atrair um público cada vez mais diverso, graças à criação de oportunidades musicais que também alberga. Somos muito criteriosos, mas temos a felicidade de sermos bastante ecléticos, o que nos permite beber, com gosto, de várias fontes. E hoje, posso afirmar com grande satisfação, que há um público Fade In que também se deixou seduzir pelo ecletismo das nossas propostas e que tanto vai a um concerto de música eletrónica, como a um de post-punk, de música neoclássica ou de música experimental. Esta é a talvez a maior fortuna de um trabalho que acumula anos, a par das centenas de concertos de artistas nacionais e internacionais que a Fade In teve o privilégio de acolher desde a sua fundação.

A gestão de um circuito tão exigente como este pode resumir-se em três palavras: paixão, organização e entrega. A abrangência musical é importante porque é representativa do nosso ecletismo musical e é também nessa abrangência que estes eventos mais se assemelham. O que os difere, verdadeiramente, é o local onde acontecem. O organismo desta associação é composto por nove pessoas a trabalhar após o expediente e em regime de pro-bono. No plano de ação está a preparação do FADEINFESTIVAL, do ENTREMURALHAS, do MONITOR e o mais recente CLAP YOUR HANDS SAY F3ST, um festival que tem a duração de três meses e cujo o cartaz é constituído exclusivamente por bandas nacionais. Além disso, existem outros projetos em expansão, como o Ensina Fade In, dedicado ao público infantil; o Estilhaços, em coordenação com a Eco - Associação Cultural e que é um evento artístico multidisciplinar; e ainda o ZÚS!, um concurso que apresenta novas bandas em escolas secundárias e que já apoiou nomes como os First Breath After Coma, Whales e a Surma.

Vamos por partes. Digamos que o festival ENTREMURALHAS é a consequência inata do FADEINFESTIVAL e o festival MONITOR, por sua vez, do festival ENTREMURALHAS. Entre os três, o primeiro é, sem dúvida, o mais mediático. Desde 2010, atrai público estrangeiro a Leiria que se desloca propositadamente ao Castelo da cidade para assistir ao vivo alguns dos maiores nomes de culto internacionais da música “gótica”.

O FADEINFESTIVAL é um festival com um cariz mais itinerante e acontece tanto em teatros como em clubes, bares ou discotecas. É o mais eclético dos nossos festivais, comenta. O próximo episódio é um concerto com os eslovenos LAIBACH no Teatro Miguel Franco, em Leiria, no dia 27 de Novembro, com bilhetes a 30 euros, e esgotou com dois meses de antecedência. É esta a magia e o poder da FADE IN. Finalmente, o MONITOR - Minimal Wave & Post-Punk International Rendez-Vous é um festival indoor e dedica-se sobretudo ao minimal-wave e ao post-punk.

Na verdade, como sabe quem me conhece, eu sou um gajo simples do underground e sem tiques de "não me toquem”, mas não posso deixar de sentir um enorme orgulho neste trajeto que tenho percorrido, sempre com grande empenho e com extrema dedicação, refere. O Carlos é igualmente o fundador das célebres “Unknown Pleasure Nights” que aconteciam no Beat Club. Para além dos dj sets audaciosos e muito atrevidos, mais de 500 sábados receberam bandas ao vivo, transformando este espaço num dos palcos mais conhecidos a nível nacional. Para já, e enquanto as obras para remodelação no Beat Club não terminam, as "Unknown Pleasure Nights" têm lugar no Clube Musique.

Planos para 2018? Que seja tão bom ou melhor como 2017 que, até agora, tem sido muito positivo para as minhas atividades e para as da Fade In. Neste momento, as programações das próximas edições dos seus festivais estão em construção e claro, continua a ser meu objetivo viver com grande intensidade sem nunca perder o sentido de bom senso, responsabilidade e descontração.

oiçam o programa de música do Carlos em: www.unidade304.com

sobre a Fade In - Associação de Acção Cultural: www.fadeinfestival.com

Por: Teresa Melo
Fotografia: Ricardo Graça

Partilhar