Um Indiegente que não é indiferente

Existem projectos que não cabem no espaço que os tem. Pela substância, pela envergadura, pela ousadia. Na rádio portuguesa, esse projecto é o Indiegente. E é por isso e pelas suas duas décadas de emissão na Antena 3, que as condições estão mais do que reunidas para o Indiegente Live no dia 13 de Outubro no LAV-Lisboa ao Vivo. Se quisermos ser justos, demasiado grande para se ficar por aqui.

Uma emissão adulta com carácter de teenager

É em finais do ano de 1997 que o programa, até então um sujeito sem-nome definido pelo estilo de música underground que transmitia, começou a ter um cariz diário e, “por isso, nessa altura, andava já a congeminar que nome é que ia ter”, explica Nuno Calado. “Recordo-me que naquela altura, bati à porta de três, quatro pessoas e aqueles que chegaram primeiro com um indicativo foram os RAINDOGS. Telefonei ao Paulo Ventura que tinha várias bandas e expliquei-lhe mais ou menos o que queria: trinta a quarenta segundos de som que não estivesse editado”. Em duas semanas, Calado recebeu a proposta e levou-a em CD para casa. “Ouvi e claro que saltaram algumas dúvidas, mas pensei, “se é isto, ‘bora lá’. E a verdade é que a banda cumpriu a função e já lá vão 21 anos”.

Embora o programa tenha atingido a sua maioridade, nunca deixou de ser arrojado como um miúdo. Talvez seja esta a qualidade também do Nuno Calado, que se considera um adulto meio rebelde e com uns laivos de adolescente. “Tenho sempre a vontade de que haja alguma irreverência e há um procurar constante para ter música nova no programa”, justifica. O fascínio por essa descoberta, muito alimentada também pela facilidade no acesso à música faz a matéria de um programa que continua a ser alternativo no verdadeiro sentido do conceito. “A música nova é sempre música nova desde que estejas a descobri-la, e às vezes encontro coisas que foram feitas há quarenta anos e que são maravilhosas”. Umas que lhe passaram ao lado porque não estava desperto para isso, outras que lhe eram completamente desconhecidas. Só nunca fez nem fará sentido ficar no mesmo lugar.

Uma celebração que em nada é indiferente

O plano era claro. Festejar os 20 anos do programa e nem os imprevistos pelo caminho conseguiram destronar o entusiasmo. A história começou no Reverence Valada 2017, no palco do Indiegente. “O festival tinha a dimensão que tinha, os cachets eram o que eram e alguns músicos disseram-me “na verdade até podias estar a trabalhar numa coisa tua”. Comecei a pensar nisso, mas queria mesmo fazer um festival? Porquê mais um festival? Tinha que haver alguma coisa que justificasse. De repente lembrei-me que o programa ia fazer 20 anos e seria a altura certa de fazer isto”, conta.

Excluída a primeira hipótese, Calado decide partir para a segunda, ou seja, a produção de um espectáculo non-stop. Mais do que a partilha do mesmo palco, “o que quis reunir ali são músicos que gosto e que respeito não só pelo trabalho, mas também como pessoas. Já que é uma festa, que seja com aqueles que estão perto do coração, que conheci sempre primeiro pela música e depois acabamos por estabelecer uma relação de amizade”.

Um amigo apresenta o próximo e entre transições, saídas e entradas, do palco para o público e vice-versa, é um lugar de possibilidades. “Neste caso, vai começar com a Surma, que adiciona as Señoritas. Se calhar fazem uma música nova e isto foi deixado ao critério delas. A Surma sai, ficam as Señoritas e vão ter outro convidado que é o Tó Trips. E a coisa vai se desenvolvendo assim”, explica o radialista.

Adolfo Luxuria Canibal, Fast Eddie Nelson, Crise Total, Frankie Chavez, Mazgani, Mr. Gallini, O Gajo, Sam Alone, Saturnia, Scúru Fitchádu, Sean Riley, Señoritas, Surma, The Poppers, Tó Trips, We Bless This Mess e poderiam ser outros tantos. “Ter aquele encontro entre estas pessoas vai tornar a noite numa cena cheia de boa onda. São vinte e um anos de programa, mais uns quantos anos de rádio em cima disso e, no final, há um lado importante para mim que é a integridade”, afirma Calado. A integridade do programa diário e a integridade com os músicos, que muitos aceitaram porque é o Indigente.

“Para mim, mais importante do que a qualidade técnica do evento é olharmos uns para os outros no final e dizer “divertimo-nos imenso”. No Indiegente Live a música não se inventa; reencontra-se no dia 13 de Outubro no LAV-Lisboa ao Vivo.

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por: Teresa Melo
fotografia: Vera Marmelo

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